sexta-feira, 29 de março de 2013

"Moendo Gente - A situação do trabalho nos frigoríficos" - altlander@gmail.com - Gmail


Escravo, nem pensar! Publica caderno temático “Moendo Gente – A situação do trabalho nos frigoríficos”
06/03/2013
Publicação discute a situação do trabalho nas indústrias frigoríficas brasileiras
O programa Escravo, nem pensar!, com apoio da Catholic Relief Services e da TAM Airlines, lançou em março o caderno temático “Moendo gente – A situação do trabalho nos frigoríficos”, voltado para educadores que queiram abordar o tema em atividades na escola ou com outros públicos.
Além do conteúdo informativo, caderno traz 
sugestões de atividades didáticas
A publicação didática confronta o fato de o Brasil ser o maior produtor de carnes do mundo com as difíceis condições de trabalho nas plantas frigoríficas. Além disso, são apresentados depoimentos de trabalhadores, que revelam suas duras histórias nas linhas de abate de bovinos, aves e suínos.
Em 2011, os frigoríficos brasileiros exportaram 15,64 bilhões de dólares em produtos. No entanto, por trás do grande lucro gerado por este setor existe um quadro marcado pela exposição dos trabalhadores a sérios riscos à sua saúde física e psicológica nesse ambiente de trabalho.
Jornadas exaustivas, ritmo ininterrupto de produção, pressão psicológica, elevada carga de movimentos repetitivos e exposição a baixas temperaturas são algumas situações que compõem o cenário do trabalho em muitos frigoríficos do país.
Vale, então, a pena manter um sistema de produção que adoece e lesiona tantos trabalhadores para inflar as exportações do país? Reflexões como essa são suscitadas neste caderno temático, que faz parte de um conjunto de produções da Repórter Brasil, voltadas para o mesmo tema:
  • O premiado documentário “Carne e Osso” (2011) apresenta a realidade impactante e depoimentos que revelam o árduo cotidiano do trabalho nos frigoríficos brasileiros.
  • Listado entre os 10 melhores projetos de jornalismo digital pela Revista Superinteressante, o hot site "Moendo Gente" denuncia, em formato multimídia, acidentes, doenças e outros problemas decorrentes do trabalho na indústria da carne

quinta-feira, 28 de março de 2013

A origem das sociedades

A origem das sociedades:
wilson
Acaba de sair pela Companhia das Letras o novo livro de E. O. Wilson, pai da sociobiologia. E é polêmico, como conta a ótima reportagem que saiu ano passado na revista Piauí. Em 1975, Wilson gerou tanta indignação ao propor bases biológicas para o comportamento social, que chegou a receber um banho (literal) de água gelada quando manifestantes lhe despejaram uma jarra durante um congresso. Agora ele volta a pôr a cabeça em risco ao questionar a base teórica que sustentou sua própria argumentação. Se requer coragem admitir que estava equivocado, a ousadia é ainda maior quando se trata de repensar toda uma área de pesquisa.
O parentesco entre integrantes de um grupo, ele defende, não basta para sustentar as complexas sociedades que caracterizam seres tão diferentes quanto formigas e pessoas. Entra em jogo outra vez a seleção de grupo, há décadas posta de escanteio.
A conquista social da Terra é leitura obrigatória para quem se interessa por entender a formação de sociedades do ponto de vista biológico. Para chegar a uma explicação para o enigma que o ocupa há décadas, o autor se debruça sobre seus insetos favoritos – as formigas – em comparação com os seres humanos e outros organismos.
Quando li o livro, fui pedir a opinião de amigos norte-americanos que ganham a vida investigando a evolução da socialidade. Não tinham lido o livro ainda, mas com base em artigos dos últimos anos o consenso parecia ser que o Wilson não está trazendo nenhuma grande novidade – estaria, na verdade, fazendo barulho com ideias que andam no ar, por aí. É o que ele faz de melhor, pensei, reunir ideias espalhadas e sintetizar num corpo teórico. Neste caso, achei que a leitura vale a pena seja para concordar ou para discordar. Fonte rica de reflexão e discussão.
O livro é dividido em seis partes. Na primeira, Wilson faz considerações sobre por que existe a vida social avançada, conhecida como eussocialidade. O que faz um animal abrir mão de sua própria segurança e conforto, e até de se reproduzir diretamente, enquanto contribui para o sucesso reprodutivo de outros com quem convive? Um dilema evolutivo que chegou a fazer Darwin duvidar de sua própria teoria da seleção natural. Para Wilson, a questão é crucial: sem entender a vida social, não se chega ao cerne do que é a condição humana.
A segunda parte narra o surgimento do ser humano, desde seus ancestrais até o homem moderno, Homo sapiens. Já nessa parte Wilson dá estocadas nas bases teóricas dos estudos de socialidade que pretende implodir. Boa parte da colaboração entre membros de um grupo tem sido explicada com base no parentesco: ajudar um parente próximo (com quem se compartilha genes) a se reproduzir equivale a passar seus próximos genes adiante. Para o autor, essa teoria não explica a evolução de grupos sociais, e por isso ele invoca uma força evolutiva que por muito tempo permaneceu quase um tabu: a seleção de grupo. Em linhas gerais, grupos mais bem sucedidos deixam mais descendentes e têm maiores chances de produzirem membros com tendências a se manterem agrupados e cooperar.
Na terceira parte, Wilson mostra como os insetos sociais dominaram o mundo. Descreve exemplos que ele mesmo observou e reúne um conhecimento que ajudou a construir, como um dos maiores especialistas no campo.
A quarta parte do livro traz a discussão central sobre as forças da evolução social e detalha a nova teoria desenvolvida e defendida por Wilson. Em seguida, ele se debruça sobre a condição humana. A cultura, a capacidade de elaborar linguagem e exprimir ideias abstratas, a variedade cultural e como essa cultura evolui em paralelo (e colaboração mútua) com os genes, a moralidade, a religião, a arte. Por fim, tece considerações a respeito de para onde vai a humanidade: a única espécie que desenvolveu a capacidade de modificar seu próprio ambiente a ponto de destruí-lo.
Com A conquista social da Terra, Wilson promete voltar a outra de suas especialidades: causar polêmica que pode dar origem a uma discussão construtiva. Richard Dawkins deu um pontapé inicial na discussão com uma resenha demolidora na Prospect Magazine. Wilson rebateu sumariamente as críticas em dois parágrafos (em seguida ao texto de Dawkins). Não sei se teve continuação, se alguém souber tenho curiosidade.

vi no ScienceBlogs.com.br 

ARRENDATÁRIO AMEAÇA COMUNIDADE DA ALDEIA TAKWARA EM MATO GROSSO DO SUL

ARRENDATÁRIO AMEAÇA COMUNIDADE DA ALDEIA TAKWARA EM MATO GROSSO DO SUL:
da pagina do Tribunal Popular

Arrendatário de uma porção da fazenda “Brasília do Sul”, situada dentro dos limites da Terra Indígena Takwara foi até a sede da aldeia para ameaçar as lideranças e avisar que o desmatamento continua!


Como foi divulgado no último dia 22 de março, o extermínio das matas da aldeia Takwara ainda não cessou e os latifundiários da região além de desmatarem a única área preservada dentro dos limites da aldeia, passaram a ameaçar a comunidade e desta vez, os criminosos, de maneira ainda mais desinibida e truculenta, foram até a sede da aldeia para avisar que o desmatamento vai continuar.

É sabido que a mata remanescente da região está sendo derrubada para a expansão da lavoura de cana já existentes ilegalmente dentro dos limites da aldeia.

Segundo lideranças locais, estimasse que hoje há cerca de 30 capangas armados que se revezam em turnos controlando a estrada de acesso, trilhas e fazem a vigília do maquinário usado e da operação.

Desde dezembro de 2012, o Tribunal Popular vem alertando sobre o acirramento do conflito contra os Guarani Kaiowá da Aldeia Takwara no município de Juti (MS). Os indígenas vem sofrendo todo tipo de violência, desde ameaças de morte a suas lideranças até a destruição das matas de seu território originário.

Em janeiro de 2013, foram registramos dois incêndios criminosos na aldeia, com a intenção clara de preparar o terreno para a ampliação do cultivo da monocultura cana-de-açúcar.

Diversas foram as ameaças contra as principais lideranças da aldeia, estas ameaças só foram amenizadas depois de muita pressão realizada pelos indígenas para que a Força Nacional fizesse uma intervenção e permanecesse por um período na área, até que fossem presos os jagunços que estão a serviço do fazendeiro Jacinto Honório da Silva. Lembramos que o Sr. Jacinto Honório não foi responsabilizado por mais esse delito.

A tensão instalada nesta região do Mato Grosso do Sul e a permanente omissão do Estado brasileiro sobre a resolução em definitivo da demarcação e homologação desta Terra Indígena, tem intensificado cada vez mais a violência por parte dos fazendeiros contra o povo Kaiowa e Guarani, o exemplo mais recente dessa prática foi a invasão de um dos arrendatários das terras da Fazenda Brasília do Sul (que se sobrepõem a Aldeia Takwara), para desmatar a última reserva florestal presente nesta área. Diversas testemunhas relataram ao Tribunal Popular que na manhã desta terça-feira (26/03) este arrendatário, foi até a Takwara, para fazer pessoalmente ameaças ao povo da aldeia.

O Tribunal Popular alerta mais uma vez que o governo brasileiro tem se omitido de forma criminosa em relação as demarcações e homologações das terras indígenas no Brasil e em particular com as terras do povo Kaiowa e Guarani.

As mazelas que ocorrem na Aldeia Takwara são de conhecimento de todos os poderes públicos municipais, estaduais e federal, em especial o poder executivo federal principal responsável por resolver esta situação. Há duas semanas, seis lideranças do povo Kaiowa e Guarani, estiveram em Brasília (DF) e novamente deram ciência ao Ministro da Justiça, Ministra da Casa Civil, Procuradoria Geral da República e FUNAI, sobre a situação desumana vivida cotidianamente pelos indígenas .

Caso o agravamento desta situação levar a morte ou mais violência contra o povo da Aldeia Takwara,será de inteira responsabilidade do governo federal que não honra qualquer compromisso que tenha feito com o povo Kaiowa e Guarani e os abandonou a própria sorte.  

O que acontece em MS contra o povo Kaiowa e Guarani é um crime contra a humanidade e uma tentativa deliberada de exterminar os indigenas, fazendo com que aconteça assim um etnocídio.

O Tribunal Popular, vem exigir do Estado brasileiro:

1º A imediata demarcação e homologação de toda as terras reivindicadas pelo povo Kaiowa e Guarani;
2º A garantia que nenhum falso proprietário (grileiros) entre e destrua as terras do povo Kaiowa e Guarani;
3º A intervenção imediata para cessar o desmatamento da última reserva de mata existente na Aldeia Takwara
4º A segurança permanente da Polícia Federal e/ou Força Nacional nas áreas de retomada do povo Kaiowa e Guarani;
5º Responsabilidade aos fazendeiros pelos crimes cometidos e fim da  impunidade;

O Tribunal Popular, conclama a todxs xs lutadores do povo a se unir na luta Guarani Kaiowá e dos povos indígenas .

Tribunal Popular: o Estado brasileiro no banco dos réus

DENUNCIEM!!!
Excelentíssima Senhora Presidenta da República: Dilma Vana Rousseff
Excelentíssima Senhora Presidenta da Fundação Nacional do Índio: Marta Maria Azevedo
Ministério Público Federal de Dourados: Dr. Marco Antônio de Almeida
Ouvidoria Geral do IBAMA – Linha Verde Mato Grosso do Sul – Abel Cafure
Fone : (67) 382-2966 ou 382-1802 ramal 231
Fax : (67) 325-8987
E-mail : abel@ms.ibama.gov.br
-14.235004
-51.925280


vi no racismo ambiental

quarta-feira, 27 de março de 2013

Professor Joel Dutra explica como podemos viver mais, trabalhar menos e ainda produzir melhor

Professor Joel Dutra explica como podemos viver mais, trabalhar menos e ainda produzir melhor: O equilíbrio da pessoa com o trabalho e outras dimensões da vida faz com que ela cresça e se desenvolva.

Pensar globalmente, comer localmente

Pensar globalmente, comer localmente:
Consumidor Moderno Consciente
Think globally, act locally” (pense globalmente, aja localmente), o famoso mote de ambientalistas mundo afora é também o resumo do modo de vida e alimentação dos “locávoros”.
É cada mais forte nos EUA a tendência dos “locavores” — pessoas que preferem consumir alimentos cultivados localmente. O neologismo poderia ser traduzido como “locávoros” – similar a “herbívoros” ou “carnívoros”.
De acordo com o dicionário online Merriam-Webster, um locávoro é “alguém que come localmente sempre que possível.” Esta definição, no entanto, apenas explica o nome, mas não o motivo de existência do locavorismo. Afinal, por que alguém trocaria a praticidade dos supermercados pelo trabalho de ser a própria fonte de sua alimentação buscando por comida na localidade ao redor? Alguns motivos levam a isso:
Herbívoros comem vegetais. Carnívoros comem carne. Locávoros comem localmente. Menos gases poluentes
Locávoros geralmente começam sua busca para comer de forma mais ambientalmente sustentável, definindo um raio de quilometragem. Qualquer alimento cultivado ou feito dentro deste raio é considerado comida local.
Mas, ainda, por que definir este raio e passar pela dificuldade de ater-se a ele? Como é que isso pode ajudar a tornar “verdes” os hábitos alimentares? A verdade é que mesmo que os seus produtos favoritos usem embalagens biodegradáveis e sejam fabricados de acordo com a “etiqueta ambiental”, eles ainda terão a desvantagem da poluição causada pelos veículos responsáveis pela sua distribuição.
Além disso, ao adquirir produtos mais perto de casa a poluição emitida pelo automóvel também é diminuída ou evitada quando se pode ir a pé.
A professora de yoga Sílvia Maria é uma das pessoas que decidiu por comprar produtos nos arredores de casa. “Compro meus vegetais e ovos de um micro produtor no meu bairro (na cidade de Santo André), ele produz tomates, alguns vegetais e cria galinhas no seu quintal. Fiz isso em prol da saúde da minha família e do incentivo ao pequeno empresário”.
Menos desperdício com embalagens
É claro que só o fato de procurar comprar produtos que se preocupam em oferecer embalagens ambientalmente menos danosas já é um ponto verde a mais. No entanto, há opções ainda mais benéficas para o ambiente. Um exemplo? Imagine que ao comprar seus produtos em alguma quitanda, feira livre ou pequeno produtor próximo à sua casa você pode abdicar de quaisquer tipos de embalagens plásticas com mais facilidade, já que o caminho é curto e a armazenagem pode ser feita em sacolas ecológicas, cestas carrinhos de feira. Resumindo, comprar localmente permite que você diminua a sua própria pegada de carbono e poluição em geral.
Para tornar as coisas ainda mais interessantes, o fato é que com isso, você gasta mais dinheiro com comida de verdade e menos com campanhas de marketing, embalagens poluentes e nomes fantasia. Isso é valorizar a natureza e o próprio bolso.
* Com informações do Green Forum
(Consumidor Moderno Consciente)

by mercado ético

Novas ferramentas para popularizar a energia solar no Brasil

Novas ferramentas para popularizar a energia solar no Brasil:
Fabiano Ávila, do Instituto CarbonoBrasil
Em abril de 2012, a Agência Nacional de Energia Elétrica (ANEEL) aprovou regras destinadas a reduzir as barreiras para instalação de geração distribuída de pequeno porte, que incluem a microgeração, com até 100 KW de potência, e a minigeração, de 100 KW a 1 MW. Essas regras formam o Sistema de Compensação de Energia, que permite ao consumidor instalar pequenos geradores e injetar energia na rede em troca de créditos.
Foi baseado nessa nova legislação que o Instituto para o Desenvolvimento de Energias Alternativas para a América (IDEAL) criou duas novas ferramentas que prometem facilitar a construção de pequenas unidades fotovoltaicas nas residências e empresas brasileiras.
Uma dessas ferramentas é o Guia de Microgeradores Fotovoltaicos – Como faço para ter eletricidade solar na minha casa?. Ele contém informações sobre a capacidade dos geradores que podem participar do sistema de compensação de energia, locais que podem receber as instalações, as vantagens de se ter um microgerador, recomendações para manter o bom funcionamento e o passo a passo para conectar seus sistemas na rede elétrica com a ajuda de um profissional especializado.
“Queremos chegar até aquele indivíduo que não conhece a resolução da ANEEL, mas que gosta muito da ideia de ter um sistema de geração de eletricidade solar próprio em sua casa, escritório ou pequena indústria. Estamos dando uma mãozinha para concretizar essa vontade”, afirmou Paula Scheidt Manoel, gerente de projetos do Instituto Ideal.
O guia explica que o valor para instalar sistemas fotovoltaicos vem diminuindo anualmente e que com a nova regulação da ANEEL a geração descentralizada de energia fotovoltaica tornou-se uma opção interessante para consumidores de quase todo o Brasil.
“Agora, quem tem acesso à rede elétrica e deseja ter um sistema fotovoltaico não precisa mais ter baterias, pois a rede pode atuar como uma bateria. O consumidor injeta na rede o excedente e depois consome normalmente quando o sistema fotovoltaico não está gerando energia. A compensação desse consumo acontece a partir dos créditos em kWh, que o consumidor receberá pela energia injetada na rede – isso é o sistema de compensação de energia, ou, como é conhecido internacionalmente, net metering”, detalhou Paula.
Simulador
A segunda ferramenta lançada nesta terça-feira (26) é o Simulador Solar, que calcula qual deve ser a potência de um sistema fotovoltaico para atender à necessidade energética anual de uma casa ou empresa.
O simulador leva em conta a posição geográfica da futura instalação e o preço da energia na região. Além disso, foi desenvolvido para calcular todos os resultados se baseando nas novas regras da ANEEL, assim o sistema projetado teoricamente ficará do tamanho ideal para deixar a casa ou empresa pagando apenas as taxas obrigatórias das distribuidoras de energia.
“No início do ano passado, nós começamos a discutir a ideia da criação de um programa que automatizasse, de maneira muito simples, o cálculo de dimensionamento de um sistema fotovoltaico para qualquer lugar do Brasil. Existem vários softwares que permitem fazer esse cálculo, porém com um nível de detalhamento que somente profissionais que trabalham com energia fotovoltaica são capazes de usar”, disse Paula.
“O nosso simulador faz um cruzamento da eletricidade que você necessita para a sua edificação e a radiação da sua localidade, com base no Atlas Solarimétrico do Brasil. Ele simula um sistema para abastecer 100% da sua demanda menos o custo de disponibilidade, conforme prevê a resolução 482 para consumidores do grupo B da ANEEL. Fizemos assim para que o usuário se beneficie com o sistema de compensação de energia, e utilize os créditos que foram gerados no decorrer do ano”, completou.
Por exemplo, uma casa trifásica localizada em Florianópolis que consome uma média de 700kWh por mês e com as contas na faixa de R$ 315, o simulador gera como resultado:
“Com base nos dados de consumo elétrico informados por você e na radiação solar do local selecionado, um sistema fotovoltaico (gerador de eletricidade solar) de cerca de 5,4 kWp de potência instalada atenderia sua necessidade energética. O sistema proposto geraria em média 6,25 MWh por ano, quantidade essa de eletricidade que você não precisará mais pagar à sua distribuidora. Desse modo, você também evitaria a emissão de 1.823 quilogramas de dióxido de carbono (CO2) por ano”.
Porém, o simulador salienta que o resultado “serve apenas para lhe dar uma ideia da potência necessária para a sua demanda elétrica. A simulação não considera as condições da vizinhança do local estabelecido para instalar o sistema e que podem levar a uma revisão da produção elétrica devido aos sombreamentos dos módulos, tais como árvores ou edificações próximas”.
Segundo cálculos do Instituto Ideal referentes a março de 2013, um sistema fotovoltaico completo e instalado de 1 kWp (1000 Wp) custa, aproximadamente, R$ 7.000,00 (ou R$ 7,00 o Wp). Assim, nossa casa exemplo investiria algo em torno de R$ 37 mil em seu projeto de energia solar.
As novas ferramentas foram desenvolvidas pelo Instituto Ideal com apoio da Cooperação Alemã para o Desenvolvimento Sustentável, por meio Deutsche Gesellschaft für Internationale Zusammenarbeit (GIZ) GmbH e Kreditanstalt für Wiederaufbau (KfW). O Guia tem ainda o apoio institucional da Agência Nacional de Energia Elétrica (ANEEL), Associação Brasileira de Energia Solar (ABENS), International Solar Energy Society (ISES), Escritório regional de Ciência para a América Latina e o Caribe da UNESCO e o Grupo Fotovoltaica da Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC).
(Instituto CarbonoBrasil)

by mercado ético

Kabengele Munanga: Só o discurso não é suficiente para acabar com o racismo [ou O racismo brasileiro é um crime perfeito]

Kabengele Munanga: Só o discurso não é suficiente para acabar com o racismo [ou O racismo brasileiro é um crime perfeito]:

Recentemente aposentado após 32 anos dedicados à vida acadêmica,  mantém ativa a militância intelectual no Movimento Negro e participa de palestras pelo País em que defende ações afirmativas. O estudioso foi um dos palestrantes do 2º Congresso Anual do Instituto de Estudos Brasil Europa (IBE), ocorrido no início de março em Belém.
Nascido no antigo Zaire, atual República Democrática do Congo, Kabengele chegou ao Brasil em 1975 para o Doutorado em Antropologia na USP. Em 1977 retornou ao seu País de origem, mas por questões políticas – na época vivia-se um período de ditadura -, não pode permanecer. De volta ao Brasil, lecionou na Universidade Federal do Rio Grande do Norte. Em seguida, estabeleceu-se como professor da USP e ingressou no Movimento Negro como pesquisador.
Defensor das cotas, o estudioso questiona na entrevista abaixo o mito da democracia racial no Brasil, diz que não se considera um ativista negro – e sim um militante intelectual -, e explica porque acredita que o racismo brasileiro é um crime perfeito.
- Como sua trajetória o levou ao Movimento Negro no Brasil?
Cheguei ao Brasil em 1975 para defender o Doutorado na USP, finalizando em 1977. Depois voltei ao Congo mas, por questões políticas, não pude permanecer. Alguns meses depois voltei ao Brasil e comecei minha carreira acadêmica como professor convidado da Universidade Federal do Rio Grande do Norte, onde fiquei de 79 a 80. Em 80 entrei na USP e me aposentei por lá. Portanto a minha entrada no Movimento Negro foi mesmo como pesquisador. Não foi como ativista negro, mas militante intelectual. Tenho defendido as causas, realizado publicações como um estudioso engajado. Não é um discurso totalmente neutro.
- O que acha das ações afirmativas que estão sendo implementadas no Brasil nos últimos anos? O País está no caminho certo?
Estamos no início do processo. O País conviveu muitos anos com o mito da democracia racial e, por isso, nunca implementou políticas de inclusão para a população negra. O pensamento era “não somos racistas, não precisamos de políticas de inclusão.” Apesar da luta constante do movimento negro, que passou de geração em geração, a verdadeira política de inclusão começou no governo de Fernando Henrique Cardoso. Na época o Brasil participou oficialmente da Conferência de Durban (que ocorreu na África do Sul em 2001) contra o Racismo, a Discriminação Racial e a Xenofobia. De lá o governo voltou com a proposta de cotas. Em 2002, a Assembleia Geral do Rio de Janeiro adotou uma lei impondo política de cotas com porcentagem de negros e brancos nas escolas públicas. Foi o ponto de partida que fez com que a discussão alcançasse âmbito nacional.
- E as universidades acabaram adotando este modelo?
Várias universidades estaduais e federais se inspiraram, utilizando-se da autonomia universitária para adotar o sistema de cotas. A UnB foi a primeira federal. Depois vieram a UFBA e universidades do Sul do Brasil como as do Rio Grande do Sul, Santa Catarina e Paraná. Ficou a resistência nas universidades paulistas, como a USP, Unesp e Unicamp, e algumas universidades federais de Minas Gerais. Agora, com a lei aprovada pela presidente Dilma, todas as universidades federais são obrigadas a trabalhar com cotas. Mas a lei não atinge as estaduais.
- Por que acredita que o sistema de cotas é importante para o Brasil?
Entre os brasileiros que têm diploma universistário, 97% são brancos, 1% asiáticos e 2% negros e mestiços. Apenas 2%. No entanto, eles representam mais de 50% da população brasileira. Há aí um problema a se resolver, um claro abismo. E esse problema não se resolve apenas com o discurso de políticas universalistas da escola pública de boa qualidade. Por isso este caminho de políticas de inclusão foi pensado. É a porta, no modelo daquilo que foi feito nos EUA na década de 60 e que conseguiu incluir os afroamericanos, reduzindo o abismo de 50% para menos de 10%. Acredito que o sistema de cotas é um caminho de inclusão rápido. A UnB, por exemplo, em 10 anos recebeu mais negros do que em toda sua história.
- Fala-se que, em pesquisas por exemplo, muitas pessoas teriam dificuldade de considerarem negras. Acredita mesmo nessa dificuldade?
Acho que não há nenhuma. A dificuldade são os intelectuais que têm. Os policiais não têm dificudade de saber que são negros, os zeladores dos prédios também não. São os intelectuais que têm dificuldade em um país onde existe discriminação racial. Significa que quem discrimina sabe quem é o negro. Isso é na verdade um falso problema.
A criminalização do racismo é um bom mecanismo para minimizar o problema?
Sim, a lei é importante. A prática de discriminação racial é crime inafiançável. Tem de haver a lei para punir as pessoas e reprimir as práticas racistas. Mas a lei sozinha não resolve tudo. É por isso que o Supremo Tribunal Federal (STF) voltou com a constitucionalidade das cotas. Sabe que as leis são importantes, mas além deles é preciso implementar políticas públicas de mudança material. Perante a lei somos iguais, mas é uma igualdade formal, porque materialmente não somos iguais. Isso só se faz com políticas públicas, afirmativas.
O senhor já chegou a dizer uma vez que o racismo é um crime perfeito no Brasil. Por quê?
É um crime perfeito porque quem o comete acha que a culpa está na própria vítima. Além do mais, destrói a consciência dos cidadãos brasileiros sobre a questão racial. Nesse sentido é um crime perfeito.
- Algumas pessoas têm resistência com a questão de cotas, acham que aumentaria a discriminação. O que acha disso?
Esta é uma questão de consciência, porque disseram para a elas que entrar com cotas é como dizer que não são inteligentes para passar pela grande porta. Abrir a pequena porta seria discriminação. Eu entrei na universidade, fui professor da USP, cheguei no topo da carreira, formei outros estudiosos. Mas o meu caso não é como o da maioria. O sucesso individual não representa o sucesso coletivo. Essas pessoas não têm consciência disso e acham que é uma diminuição psicológica. Mas se você pensar nas vítimas do Holocausto, elas hoje recebem indenização mas não são diminuídas por isso. O que se faz são políticas compensatórias de inclusão. Essas pessoas dizem isso porque a ideologia dominante botou na cabeça delas que estão se inferiorizando pelo fato de receber cotas.
- Existe uma diferença na forma como o Congo e Brasil lidam com a questão racial?
Os problemas nos países africanos não são de discriminiação racial, mas econômica. Porque se cria cada vez mais pobreza, uma minoria se enriquece roubando o dinheiro público. A questão fundamental é da discriminação de classe, porque a maioria da população africana é negra. No Brasil o negro acumula duas discriminações: a de classe e a de cor. O branco acumula só uma.
Fonte: Assessoria de Comunicação do IBE – Publicado originalmente por CENPAH


vi no racismo Ambiental...

Fundamentalismo e capital: “O mercado de almas selvagens”, por Felipe Milanez

Fundamentalismo e capital: “O mercado de almas selvagens”, por Felipe Milanez:

Davi Kopenawa Yanomami: "Eles não invadiam a terra, mas a nossa cultura, a nossa tradição, o nosso conhecimento". Foto: acercandoelmundo.com
Missionários cristãos investem pesado na evangelização dos índios brasileiros com métodos ortodoxos, investimento internacional e persistência messiânica
Jesus ressuscitou. Saiu do sepulcro e apareceu primeiro para Maria Madalena. Em seguida, ela anunciou aos que haviam estado com ele. Manifestou-se a dois que iam para o campo, e depois a outros. Finalmente, de acordo com o Evangelho segundo Marcos, capítulo 16, Jesus apareceu aos 11 assentados à mesa “e lançou-lhes em rosto a sua incredulidade e dureza de coração, por não haverem crido nos que o tinham visto já ressuscitado”. Disparou então, segundo o livro sagrado dos cristãos, a mensagem determinante da “missão”, em versículos 15 e 16:
“E disse-lhes: ide por todo o mundo, pregai o evangelho a toda criatura.” (…)

“Quem crer e for batizado será salvo; mas quem não crer será condenado.”
No versículo 17, ainda segundo Marcos, Jesus vai mais longe: “E estes sinais seguirão aos que crerem: em meu nome expulsarão os demônios, falarão novas línguas”.
Condenadas à danação de um pecado original estão as criaturas não batizadas, portanto, todas as culturas não cristãs. Aos crentes, foi dada a obrigação, na forma de uma missão, da evangelização universal: eles deveriam traduzir a Bíblia para todas as línguas. Tarefa arriscada nos “confins da Terra”, que viria a ser complementada, pelo versículo 18, com a proteção divina: “Pegarão nas serpentes; e, se beberem alguma coisa mortífera, não lhes fará dano algum; e porão as mãos sobre os enfermos, e os curarão”.
Outubro de 2011, Caldas Novas, interior de Goiás: em um hotel de águas termais, tendas estão dispostas como uma conferência comercial, ou como uma feira de negócios na qual empresas utilizam estandes para vender seus pacotes e produtos. “Judeus por Jesus”; “Curso de Evangelização de Árabes”; “Missão Novas Tribos do Brasil”; “Adote um Povo”. Índios, ciganos, quilombolas, pobres do sertão nordestino: no VI Congresso Brasileiro de Missões, todas as criaturas desprovidas possuem representantes que negociam suas almas.
Minha alma, ateia, é a única condenada que circula pelo local. “Experimenta uma vez”, diz um senhor, com sorriso maroto no rosto. “Sou careta”, brinco. Ele quer que eu experimente a religião dele, como se fosse uma cápsula de felicidade a ser engolida. “Experimenta, você não vai se arrepender. Você vai ser feliz.”
Desconverso, contando histórias de aventuras na Amazônia. “Já sei”, diz o pastor Thomas Gregory. “Precisamos de gente com coragem.” Ele me oferece um exemplar do livro O Contrabandista de Deus, com a seguinte dedicatória: “Por Jesus vale a pena gastar nossas vidas! Experimente!” Em seguida, me apresenta a um jovem destemido da missão “Portas Abertas: Servindo Cristãos Perseguidos”. “Estamos indo traficar Bíblias para a China em dezembro. Ano que vem, vamos levar até a Coreia do Norte”, o rapaz me relata, determinado, consciente dos riscos de antecipar o que acredita ser o “julgamento final” e negando qualquer tipo de medo. “Não. Jesus está comigo”, diz.
No encontro organizado pela Associação de Missões Transculturais Brasileiras (AMTB), os índios são apenas uma parte de um universo pagão de almas condenadas. Parte pequena, porém cobiçada: de acordo com levantamento da própria AMTB, os índios são compreendidos como 616 mil indivíduos de 340 etnias (para a Funai são 220) e que falam 181 línguas. Ainda segundo os mesmos cálculos, no Brasil há 69 línguas sem a Bíblia traduzida, 182 etnias contam com presença missionária evangélica e 257 programas de evangelização estão em curso, coordenados por cerca de 15 agências missionárias de diferentes denominações evangélicas históricas, mas em sua maioria batista, associadas à AMTB.
De todas as almas selvagens existentes, as consideradas mais valiosas são as dos índios ditos “isolados”: elas representam o universo a ser conquistado e cuja alma adquire maior valor, econômico e moral, no mercado espiritual. O levantamento da AMTB indica que 147 etnias não possuem a presença missionária evangélica, e que 27 povos seriam considerados “isolados”. O principal desafio que consta no relatório “Indígenas do Brasil” são as “etnias remotas (com pouco ou nenhum contato externo)”, que somam 42 povos. A lista mais recente da Funai, a ser divulgada, aponta 84 referências onde podem existir povos indígenas sem contato. Nesses locais, geralmente áreas de difícil acesso, é proibida a entrada de qualquer indivíduo sem a autorização da Funai.
Os “índios isolados” são as comunidades indígenas que vivem de forma autônoma na floresta, evitam a aproximação com o universo ocidental e esse contato, se ocorrer, é eventual e conflituoso. A ocupação recente da Amazônia ocasionou os primeiros encontros com diversos povos, como os zo’é e suruwahá, que a Funai considera de “recente contato”. Eles recebem proteção especial em razão da vulnerabilidade física da população, suscetível a epidemias.
O principal objetivo dessas agências evangelizadoras é “alcançar” outras culturas com a leitura de sua forma de crença, daí o aspecto “trans” do tema “cultural” das religiões. “Precisamos de mais 500 novos missionários para pregar o Evangelho a todos os povos indígenas no Brasil”, conclama no microfone Ronaldo Lidório, um dos principais líderes desse movimento. Traduzindo: o objetivo é convencer os índios, assim como todas as pessoas do mundo, a se tornarem crentes – salvar as almas condenadas pelo pecado original.
Henrique Terena é alto, tem cabelos longos e usa um charmoso cocar de penas azuis de arara. Falando com desenvoltura e retórica apurada, ele anda sempre próximo a Eli Tikuna, líder indígena que vem da margem do rio Solimões, já quase na fronteira com a Colômbia. Juntos, aguardam o chamado para pregar no salão lotado de brancos, curiosos para ouvir os tais “índios crentes”.
Grandes astros da conferência, os índios pastores formam o que os missionários evangélicos consideram ser a “terceira onda evangelizadora”. Primeiro, eram os estrangeiros que aportaram no Brasil com a Bíblia debaixo do braço (no século 19 e no pós-guerra); a segunda onda ocorreu por meio dos missionários brasileiros, com a institucionalização das missões estrangeiras no Brasil, ao longo da segunda metade do século passado; e hoje os próprios índios agem como missionários.
As almas indígenas são o objeto do alcance proselitista de um determinado grupo de evangélicos, principalmente os de denominação batista (conhecidos como “históricos”). O sistema de evangelização ocorre segundo regras capitalistas, com agências, igrejas e crentes financiadores. Por trás de tudo, há diversos interesses que se aliam com a conveniência exigida para a alma condenada ser alcançada – garimpeiros no Amapá, madeireiros e fazendeiros no Pará, seringueiros no Acre, o exército no Amazonas. Nessas alianças, domesticar os selvagens para servirem de mão de obra é o objetivo dos laicos. Já o alcance e a salvação das almas é a verdadeira missão religiosa.
Em 1991, a Fundação Nacional do Índio determinou a expulsão de todas as missões das áreas indígenas e rompeu os contratos que tinha com os missionários de prestação de saúde e educação para os índios. Por parte do governo, não havia o conhecimento exato do número de aldeias com presença missionária. Mas o então presidente da Funai, o sertanista Sidney Possuelo, conhecia de perto a atuação da New Tribes Mission (hoje, Missão Novas Tribos do Brasil) junto do povo zo’é, cujo primeiro contato ocorreu em 1986. Na época, a expedição contava com a presença de Edward Luz, que atualmente é o presidente da Novas Tribos do Brasil. Antropólogos afirmaram então que cerca de 30% da população índia pereceu devido a doenças levadas pelos missionários. Possuelo, que trabalhou junto aos zo’é, determinou a retirada dos missionários assim que assumiu a Funai. Na visão de Luz, que até hoje tenta retomar contato com os zo’é, a Funai “persegue” os missionários.
“Nós, como instituição, só temos a agradecer a essa perseguição. Porque quanto mais a perseguição vem, mais nós crescemos”, afirma Luz. “O Cristianismo sempre foi pautado por isso. O sangue dos mártires regava a semente daqueles que haviam de nascer. E no governo brasileiro isso foi a mesma coisa.”
Conheci Edward Luz no V Congresso Brasileiro de Missões, em 2008, em Águas de Lindoia (SP). Naquele momento, o drama da tribo dos índios suruwahá estava à tona: a Funai havia expulsado dali o grupo “Jovens com uma Missão” (Youth with a Mission, no original). Os missionários acusavam os índios de serem violentos assassinos de crianças e praticarem o infanticídio – era preciso a evangelização para salvá-los. A Funai culpa os missionários por uma leva de suicídios que chegou a atingir 10% da população local. Marcia Suzuki foi a missionária que se colocou como porta-voz do drama. “No Parque do Xingu também praticam o infanticídio, e dizem que não”, ela declarou na época.
O tema do infanticídio foi levantado na mídia em torno de um filme de ficção, mas tratado como um “docudrama”, realizado pelo filho do fundador da Youth with a Mission, o cineasta David L. Cunningham. Em Hakani: A Survivor’s Story, índios suruwahá aparecem enterrando uma menina viva. O departamento da Funai que protege os suruwahá afirmou que os índios ficaram revoltados ao saber da história. Hakani, a tal criança índia, foi retirada da aldeia por Suzuki e hoje a acompanha em igrejas, na busca de recursos para a missão Atini. O drama de Hakani também serviu para divulgar um projeto de lei chamado Muwaji, que incriminaria funcionários públicos em caso de infanticídio e que legitimaria a presença de evangélicos em aldeias.
A bancada evangélica no Congresso Nacional, formada por cerca de 50 deputados [2011. TP], pouco se mobilizou. A maioria, pentecostal, é distante das denominações históricas, como os batistas. “Há evangélicos contra a evangelização dos índios, como os ecumênicos”, afirma Geter Borges, assessor parlamentar presente no Congresso Brasileiro de Missões. As divergências internas praticamente impediriam, diz ele, que a bancada mostrasse uma união sobre projetos – “não votam juntos, e não têm o peso e a força, por exemplo, dos ruralistas”, diz. Sobre a evangelização, Borges contextualiza: “Esse grupo da AMTB é que tem essa proposta de evangelizar os índios, que é proselitista. É a visão que se tem do Espírito Santo. Eu sou batista, mas creio que podemos ser salvos sem o batismo”.
A estratégia de utilizar os próprios índios como missionários foi definida no VI Congresso de Missões. E, para facilitar a realização do trabalho, eles farão uso de um dogma retórico: “O Estado não pode impedir um índio de encontrar um outro índio”, explica Luz. O objetivo das agências atualmente é capitalizar a maior quantidade de indígenas possível para se tornarem pastores. Para provocar uma reação pública, decidiram que irão solicitar, através dos índios kanamari, o ingresso na terra indígena Vale do Javari, onde está localizada a maior população de índios isolados remanescente do mundo. Caso a Funai negue a presença missionária, a estratégia prometida será acionar o Poder Judiciário contra o governo. “Metade dos povos indígenas não são aldeados. Um grande número frequenta as universidades. E a maioria fala: vou voltar para o meu povo e vou levar o evangelho pra eles. E contra essa força não há resistência”, conclama Luz.
O presidente da Novas Tribos insiste que o impedimento da entrada dos missionários nas aldeias tem cunho “ideológico”. “A Constituição não dá amparo para esse tipo de perseguição”, afirma Luz. “Nós temos o direito de pregar o evangelho para todo mundo. E toda pessoa tem o direito a aderir ou não. Vamos levar essa discussão às raias do Supremo.” Argumento-chave nesse debate é o que Luz chama de “direito da comunidade indígena de decidir o seu presente e seu futuro” – ou seja, de escolher sua religião. É o mesmo ponto levantado por alguns raros antropólogos que não se opõem aos missionários. “Os índios podem escolher seu destino”, declarou uma antropóloga evangélica que não quis ser identificada. “Agora, nem sempre os missionários são honestos nas opções que oferecem.”
“A motivação deles é ideológica: eles querem expandir a ideologia religiosa deles para todos os seres humanos do planeta”, rebate Márcio Meira, presidente da Funai, que alega que a Constituição Federal protege a liberdade de crença, assegurando a proteção aos locais de culto. Nesse caso, a Funai tem poder de vetar a entrada nas áreas habitadas por índios “isolados”, assim como dos povos de pouco contato: “Cabe ao Estado laico exercer o poder de proteção e impedir qualquer contato de missionários com índios isolados”.
“Alguns povos, como os zo’é, os yanomami, os suruwahá, possuem contato, mas não possuem elementos de conhecimento das outras religiões para tomar uma decisão. Temos que garantir seus espaços de liturgia”, prossegue Meira, afirmando ainda que a Fundação não intervém nos casos de povos com contato antigo com a sociedade envolvente. “A Funai tem a obrigação legal de respeitar a vontade dos índios de permanecerem isolados”, diz.
“Em 2 mil anos, a bíblia foi traduzida apenas para 500 línguas”, prega o pastor Ronaldo Lidório no grande salão do VI Congresso Brasileiro de Missões, com certo tom de indignação frente às ovelhas de seu rebanho. É a hora de provocar “um tsunami espiritual”, conforme reforça o pastor indígena Henrique Terena no mesmo salão principal. Todos parecem chocados com mais um dado “oficial” divulgado pela AMTB: “147 povos indígenas no Brasil não conhecem o Evangelho”.
O encontro das sociedades europeias com os índios na América aflorou entre os crentes a missão determinada pelo “ide” de Marcos. Pelo lado católico, a catequização foi praticada inicialmente na aliança da Companhia de Jesus, pelos jesuítas, com os estados colonizadores espanhol e português (rompida no século 18). As tentativas de conquista de holandeses e franceses foram acompanhadas de religiosos protestantes. Enquanto a famosa “Primeira Missa” católica foi celebrada em 26 de abril de 1500 pelo frade Henrique de Coimbra, o primeiro culto evangélico em terras brasileiras ocorreu mais de 50 anos depois, em 10 de março de 1557, no Rio de Janeiro, pelos huguenotes franceses. Poucos anos depois, Jacques Balleur foi enforcado por pregar a religião da Reforma junto aos índios tamoios.
Hoje, os católicos atendem sob a organização do Conselho Indigenista Missionário (Cimi), que prega, de forma oficial, o respeito às religiões indígenas. De acordo com essa leitura, o papel do Espírito Santo salvaria as almas, independentemente do batismo. “É a tese de São Tomás de Aquino. Mas alguns ainda praticam o proselitismo”, assume Paulo Suess, um dos principais teólogos do Cimi. “Nunca oficialmente. Nunca vão dizer isso abertamente em uma assembléia do Cimi. Mas na aldeia eles podem agir assim.” A última missão jesuíta em atividade no Brasil foi a Utiariti, no Mato Grosso, completamente destruída pelos índios nos anos 70. Alguns líderes indígenas, jovens na época, guardam más lembranças das atuações dos padres. “Forçavam o casamento interétnico”, recorda o índio pareci Daniel Cabixi. “A gente sofria muito.”
Com as revoluções sociais do pós-guerra, sobretudo por causa do Concílio Vaticano II, e a teologia da libertação que se desenvolveu em seguida, os católicos na América passaram a optar pelo princípio da “encarnação”, segundo manifesto escrito em Goiânia, em 1975: “Seguindo os passos de Cristo, optar seriamente, como pessoas e como igreja, por uma encarnação realista e comprometida com a vida dos povos indígenas, convivendo com eles, investigando, descobrindo e valorizando, adotando sua cultura e assumindo sua causa, com todas as consequências; superando as formas de etnocentrismo e colonialismo até o ponto de ser aceito como um deles”.
Em 1912, ocorreu a evangelização dos índios terenas, no atual Mato Grosso do Sul. Esse é o marco, entre os evangélicos, da primeira evangelização indígena no Brasil. E foi também entre os terenas que foi “plantada” a primeira igreja. Em julho de 2012, o Conselho Nacional dos Pastores e Líderes Indígenas (Conplei) prepara a comemoração do centenário desse primeiro batismo. “Vai ser um grande encontro”, promete o pastor Henrique Terena, que diz contar com a presença de indígenas evangélicos do Paraguai e da Bolívia. “Vamos receber cinco mil indígenas. E vamos criar o Conselho Mundial dos Pastores e Líderes Indígenas.” As inscrições para o evento custam de R$ 80 (índios) a R$ 200 (não índios).
Nesse verdadeiro mercado de almas que é o Congresso Brasileiro de Missões, até é possível “adotar” um povo. Em um dos estandes, a missionária explica: “Você assume esse povo, e deve orar por eles”. Além da oração, é sugerido também que sejam doados recursos para financiar o trabalho missionário. Valores não são mencionados, mas estima-se ser necessário cinco igrejas para sustentar o trabalho em um único povo. No palco, Eli Tikuna conta sobre o dia de glória que teve ao visitar uma igreja batista na Grande São Paulo: “Consegui R$ 10 mil em doações. Glória ao Pai!”
Na quinta edição do Congresso, em 2008, um empresário de São José dos Campos doou um avião modelo Caravan para a missão Asas do Socorro, que presta serviços de transporte aéreo para as agências missionárias e, segundo o comandante Rocindes Correa, conta já com 11 aeronaves. “Pregamos o evangelho integral, que cuida da alma, mas também da vida da comunidade”, diz Correa. Nesse intuito, a Asas do Socorro oferece também o transporte de médicos e dentistas evangélicos.
Segundo dados divulgados pela própria AMTB, a edição 2011 do Congresso Brasileiro de Missões custou por volta de US$ 40 mil e recebeu aproximadamente 500 pessoas (291 responderam a um questionário), sendo 40% batistas e mais da metade oriunda da região Sudeste. Um terço era de pastores, lideranças religiosas, e 98% dos presentes consideraram a programação “boa ou excelente”. A próxima edição, aliás, já tem data marcada: acontece em 2014.
E se jesus realmente retornar e for parar no meio dos índios? Dizem os crentes que a comunidade deverá estar preparada para recebê-lo – diferentemente do que aconteceu da primeira vez, quando ele nasceu em berço judaico durante a dominação romana e foi morto ainda jovem. Essa é a explicação sugerida pelo antropólogo Darcy Ribeiro, que morreu em 1997, sobre o principal motivo que leva os missionários a “gastarem sua vida” em nome da evangelização dos índios na Amazônia.
Foi Ribeiro quem trouxe os missionários do Summer Institut of Linguistics (SIL) para o Brasil, na década de 50. Preocupado com o desaparecimento das línguas indígenas, o antropólogo imaginaria que, ao custo da tradução da Bíblia, ao menos as línguas seriam documentadas, em caso de desaparecimento de um povo. Escreveu ele no livro Confissões: “Serviço maior meu foi mandar uma linguista do Instituto Linguístico de Verão, com doutorado, conviver com eles e dedicar-se por quase um ano ao estudo do idioma ofaié. Assim, ao menos sua língua se salvou pelo registro escrito e sonoro para futuros estudiosos das falas humanas”.
Quando se dedicou a salvar as línguas indígenas, Ribeiro desconhecia as ligações do SIL com a poderosa família norte-americana Rockfeller, que procurava novas jazidas de petróleo, e com a direita norte-americana e agências de informações dos Estados Unidos, fatos mostrados no livroThy Will Be Done, de Gerard Coilby e Charlotte Dennet. No Brasil, onde persiste o fantasma da “internacionalização da Amazônia”, essas ligações suspeitas fizeram crescer os temores de ações escusas dos missionários.
Se externamente há fantasmas da internacionalização, nas aldeias, os índios reclamam da interferência em suas culturas. Os missionários Manfred e Barbara Kern, da New Tribes, divulgaram que um dos líderes indígenas da tribo uru-eu-wau-wau, de Rondônia, teria cometido adultério. “Pelo que entendemos, ele é reincidente e já foi repreendido pelos outros líderes”, escreveram eles, em uma carta pública divulgada em 28 de junho. “Reze para o Senhor fazer um grande trabalho de restauração na sua vida e da sua esposa.” Os uru-eu formam um povo tupi e não são tradicionalmente monogâmicos, mas, de acordo com os missionários, estão “aprendendo a ser”.
A abordagem em relação ao adultério foi justamente o que chamou a atenção do líder indígena Davi Kopenawa Yanomami sobre a conduta suspeita de missionários. Ele afirma ter conhecido o Evangelho através da ação de membros da Novas Tribos, que estiveram presentes na aldeia yanomami Toototobi, e fez sua opção: “O missionário não é como garimpeiro. É outro político. Eles não invadiam a terra, mas a nossa cultura, a nossa tradição, o nosso conhecimento. Eles são outro pensamento para tirar o nosso conhecimento e depois colocar o conhecimento deles, a sabedoria deles, a religião deles. Isso é diferente. Eu, Davi, já fui crente. Junto com eles. Mas depois queria conhecer Jesus Cristo. E não deu certo. Um missionário não índio namorou uma yanomami. Daí não deu certo. Descobri que não é verdade. Aí eu não acreditei mais. São crentes falsos. E não acreditei mais”.
De fato, não é incomum as alianças estratégicas para a evangelização assumirem feições mais mundanas, muitas vezes contrárias aos direitos indígenas. Em um caso emblemático ocorrido em 1986, a Novas Tribos teria se unido a seringueiros que escravizavam índios no Acre, conforme relata o cacique yawanawa Biraci “Bira” Brasil.
Ainda jovem, Bira foi morar em Rio Branco (AC), onde percebeu que “nosso povo estava não apenas perdendo a língua, mas perdendo o nosso espírito. Nossa conexão espiritual com nós mesmos, com a natureza, com o nosso mundo, com os nossos ancestrais”. Decidiu, então, unir os jovens e expulsar os missionários, instalados na tribo por três décadas. “Convenceram todo mundo a ser crente. Botaram uma ameaça no nosso coração, dizendo que sem essa religião todo mundo iria para o inferno, que nós não teríamos salvação, não seríamos capaz de ser um povo feliz. Que nós vivíamos com o demônio. Que nossos rituais e nossas crenças eram coisas do demônio.”
“Eram racistas”, o cacique prossegue. “Não gostavam da gente, pareciam que tinham nojo de índio. Não deixavam índio andar no mesmo barco com eles. Não deixavam comer junto. Nos tratavam mal. Sem respeito. Principalmente os americanos. Eram muito arrogantes. A gente sofria muito. A gente tinha vergonha de ser a gente. A missão estava dizendo que a nossa cultura era coisa do demônio. Nossa ayahuasca, nossas cerimônias. Nós éramos proibidos, através da intimidação, de realizar nossos rituais. Do lado da missão estavam os seringalistas, seringueiros. Se aliavam com todo mundo. E a igreja fazia a gente aceitar ser dominado. Além da evangelização, dessa descaracterização cultural do nosso povo, ainda mantinham a presença dos não indígenas dentro da terra. Faziam a gente aceitar nossa condição de escravo.”
A expulsão dos missionários e dos seringueiros ocorreu em uma noite de 1986. Em carta publicada em 28 de fevereiro desse ano, os missionários Stephen e Corine relatam que na época os índios queriam “roubar seus pertences e queimar suas casas”. A Polícia Federal foi convocada, e Bira foi perseguido e acusado de ter se engajado com uma “organização de esquerda”.
Atualmente, Bira é referência espiritual na aldeia e há uma década organiza um dos maiores festivais indígenas do Brasil, o Yawa, quando recebe povos de outras etnias e visitantes ocidentais para celebrar a cultura e a espiritualidade yawanawa, com muito rapé e ayahuasca. Ele também viaja pelo mundo realizando rituais xamânicos tradicionais de seu povo. Aprendeu com os pajés Yawa e Tatá, que nunca deixaram de praticar os ritos, ainda que escondidos, durante a dominação da Missão Novas Tribos.
No que depender das agências evangelizadoras, porém, a luta está apenas começando. “A perseguição nos dá força. O sangue dos mártires regava as sementes daqueles que haviam de nascer”, reforça o missionário Edward Luz, prometendo jamais desistir de evangelizar o povo zo’é, de onde foi expulso pela Funai. “Nós vamos voltar para os zo’é. Não sei como. Mas vamos voltar. Nosso Deus é soberano. O homem pode espernear, mas no final vai ter um encontro com Deus. E, se não estiver preparado, vai sofrer.”
Luz prevê que, se o Estado tentar impedir a pregação da Bíblia nas aldeias, o fato poderia unir todas as denominações evangélicas, que são rivais entre si. “Se [o governo] proíbe pregar o evangelho, está proibindo a liberdade da adoração; proíbe o autor do evangelho, o senhor Jesus; e proibiu a Bíblia, proibiu o Deus criador”, diz. E desafia: “E nós partimos para um confronto”
-
http://rollingstone.com.br/edicao/edicao-63/o-mercado-de-almas-selvagens. Compartilhada por Marta Guarani Kaiowá.


vi no RacismoAmbiental

terça-feira, 26 de março de 2013

Sobre Espiritualidade Holística - Rui Grácio Neves

De alguma forma, este conto retrata a nossa atitude mental com respeito à nossa maneira considerada “normal” de focar a realidade e os problemas da vida. Procuramos em lugar errado, devido aos nossos apegos aos hábitos adquiridos. O Passado condiciona a nossa maneira de focar o Presente, o Quotidiano, o Aqui-e-Agora.
Tudo isto tem que ver com o que aqui denominamos Espiritualidade Holística. Mas não é fácil descrever este novo/velho paradigma em pocos minutos. Por isso denominamos somente “introdução” a este trabalho. Quem quiser saber mais ao respeito, poderá consultar a nossa tese de doutoramento em Filosofia, denominada ‘Filosofia de la Vivencia Holística’ (em castelhano), no nosso site:http://espacioinfinito.orgfree.com/index.htm 
2. Podemos “definir”, brevemente, o ‘Holismo’ como um novo paradigma (ou modelo epistémico) caracterizado pelo acento que põe sobre o Todo. É a procura dum Todo unitário, que dá sentido precisamente às suas “partes”. Ou seja, as partes não são independentes, mas partes de um Todo, fazem referência à Totalidade. As partes têm autonomia relativa, uma identidade relativa, mas, em último termo, não são senão expressões multi-diversas do Único Todo.
Noutras palavras, o Todo é um Um diverso, ou uma Diversidade/Multiplicidade unificada. A Identidade absoluta é o Todo, não as suas diferentes partes (identidades relativas e provisórias).
Além disso, podemos dizer que o Todo está presente em cada uma das suas partes. Uma parte é um Todo diminuto, simplificado. É este o ‘princípio hologramático’, que tanta importância tem na Física contemporânea, na construção de hologramas. É também o mesmo princípio que se aplica em Biologia, quando se quer reconstruir todo um organismo a partir de uma simples célula base desse mesmo organismo (holomorfismo). Isto significa que o Todo não é uma simples soma das suas partes, mas algo mais do que isso. É essas diferentes partes e o conjunto das propriedades interactivas entre todos os seus elementos ou partes.
Isto, que parece tão abstracto, pode-se compreender perfeitamente através de um simples exemplo.
Para entender o que é o modo de produção capitalista podemos estudar densos livros de Economia para captá-lo. Mas basta ir a uma loja da esquina e comprar lá uma simples Coca-Cola. Neste acto de compra num pequeno supermercado do bairro (se é que ainda existem...) estão implícitas essencialmente, ou basicamente, se quisermos, todas as relações fundamentais do chamado modo de produção capitalista: o preço, a relação compra-venda, o dinheiro como meio de troca, a loja, o patrão e as trabalhadoras e trabalhadores, a jornada de trabalho, a concurrência com outras lojas, o processo internacional de fabricação e distribuição do produto, a propaganda, a lógica do desejo e as expectativas criadas pelo produto em questão, etc.
Ou seja, podemos descobrir toda essa lógica capitalista (totalidade) numa simples compra de um produto na loja (parcialidade). De novo, o Todo está presente em cada uma das suas partes.
3. O Holismo, contudo, não é um paradigma novo. É muito antigo na história da humanidade. Esta vivência de que a Totalidade é o mais importante à hora de compreender o mundo e de vivenciá-lo, é tão antigo como a história da Humanidade. Modernamente, o que fazemos é tão só esclarecer melhor este processo, captar melhor os seus fundamentos e explicitá-los. Mas, como esquema mental, epistémico, é muito antigo.
Talvez não encontremos todos os seus elementos, conscientemente, em outras filosofias ou modos de pensar, mas aí estão basicamente. Por exemplo, em várias filosofias indianas, como no Advaîta Vedānta (inclusive no Vishishta Advaîta Vedānta). Também no Yoga, no Taoísmo, no Budismo Zen, em diversas místicas e místicos da Kabbalah, do Sufismo e do Cristianismo (como no Mestre Eckhart ou em São João da Cruz).
4. Vejamos agora algumas teses fundamentais do Holismo, formuladas em forma de decálogo. 
4.1. O Holismo parte da experiência de que a Realidade como tal é sempre fluida, dinâmica, nunca é estática. Como dizia o sábio Heráclito: “Nada é, tudo se transforma” (‘paradigma heraclíteo’). O Budismo falará da Lei da Impermanência (anitya). Tudo se transforma. No entanto, postula-se também a Permanência, a ‘quietude’, o ‘repouso’ (‘paradigma parmenídeo’). Mas a Permanência absoluta é inexpressável, apofática. 
4.2. A Realidade é uma totalidade unitária. Como tal o Todo é Um, Uno. As “partes” são sempre partes de um Todo. O Todo é mais do que a soma das suas partes (porque as inclui a elas e a todas as suas interconexões). “O Todo está (presente) nas suas partes”. 
4.3. Tudo está em relação com tudo. Tudo é inter-relativo, inter-relacional, inter-conectivo. É o ‘paradigma ecológico’ (defendido, por exemplo, por J. Lovelock: ‘Hipótese Gaia’, a Terra como um Super-Organismo vivo). Nada existe à margem de essa inter-relacionabilidade total. 
4.4. O Macro dá-se no micro (‘paradigma holográfico o hologramático’). A única diferença é a dimensionalidade. O Macro-micro é uma só coisa. “Como em cima, assim em baixo” (‘princípio hermético’). 
4.5. O Todo é, ou está, estruturado. Dado que é unitário, integra as diferenças, as quais não são eliminadas, mas sub-sumidas. Trata-se de um Todo “diferenciado”, multívoco (O Uni-verso é Multi-verso). A Multiplicidade e a Diversidade estão integradas e implícitas no Todo. Uno e Múltiple são duas caras da mesma moeda. Ou seja, a Realidade é uma totalidad multi-diversa. 
4.6. Sendo a Realidade fluida, impermanente, nada é substancial, permanente. Todas as identidades são provisórias, flexíveis, intercambiáveis. É o paradigma físico da “dança de Shiva”, postulado pelo físico Fritjof Capra). São identidades “ilusórias”, no sentido em que não são permanentes. 
4.7. Não há dualidade absoluta entre sujeito e objeto. O/a observador/a é o/a observado/a, e vice-versa (‘paradigma quântico’: o observador afecta o observado). Isto implica o fim do dualismo absoluto epistémico-ontológico. É uma crítica radical ao ‘paradigma cartesiano’. “A Realidade se auto-observa” (2). 
4.8. O Todo, desde o ponto de vista cognitivo-ontológico, pode ser considerado fenomenicamente e noumenicamente. (utilizando a linguagem kantiana, mas sem nos comprometermos com ela). ‘Fenomenicamente’, a Realidade comporta-se como diferenciada, múltipla, como espacialidade e temporalidade. ‘Noumenicamente’, a Realidade é una. Precisamente, a visão holística consiste em “ver” ambos aspectos inter-ligados, conjugados (‘principio aristotélico’, mas interpretado agora holisticamente). O nouménico dá-se, simultaneamente, no fenoménico, e vice-versa.
4.9. Seguindo com a terminologia kantiana, mas noutro contexto epistémico-ontológico, podemos dizer que a mente humana (‘entendimento’, en Kant) só pode captar discursiva-mente os fenómenos. Para captar o Todo com as suas diferenças, ou seja, o ‘noumeno’ com (em) os ‘fenómenos’, compreensivamente, precisa de um acto intuitivo, transcendental (uma espécie de ‘Razão intuitiva’, utilizando paradoxal-mente a terminologia kantiana, evidentemente com outro sentido). 
4.10. Só que este acto intuitivo (ou intuição originária) não é expressável em conceitos (pensamento discursivo) e está para além da racionalidade comum (analítica), já que esta é verbal. É experienciável, sendo uma experiência pura, originária. Uma experiência não reduzível ao espaço-tempo (melhor seria denominá-la ‘vivencia’ (3)). Noutras palavras, o Todo só é captável por intuição transcendental. A racionalidade analítica só observa fragmentos. A captação da totalidade é um processo intuitivo, sintético. É feita de maneira paradoxal, simultânea, espontânea, ruptural (se bem que existem diferentes escolas: umas mais ‘rupturistas’ e outras mais ‘gradualistas’).
Noutras palavras, a vivência holística é uma visão sinóptica da Realidade. É apofática (não se pode dizer ou expressar), mas vivenciável (‘vivência absoluta’), em princípio por e para todo o ser humano (4).
5. Vistos estes aspectos básicos da filosofia holística, vejamos agora as suas formulações a nível da Espiritualidade. 
5.1. Uma Espiritualidade holística (EH) será, portanto, uma Espiritualidade não dual, integrativa. Ou seja, uma Espiritualidade onde cessem os dualismos que contrapõem espiritual e material, mística e ciência, espiritualidade e política (mística e revolução), mente e braço (intelectual-manual), razão e emoção, masculino e feminino (pois é andrógina ou ginândrica).
Há outras dualizações mais trágicas, como a que opõe os privilegiados a nível económico, super-remunerados, àqueles/aquelas (mais elas do que eles, a nível mundial...) super-explorados pelas relações de trabalho capitalistas. Ou os países do denominado “Primeiro Mundo” aos do “Terceiro”, “Quarto”, “Sétimo Mundos”... e por aí afora. Ou dos que têm os seus direitos humanos (mais ou menos) respeitados àqueles que nem têm nem os “direitos animais” reconhecidos...
Pessoalmente, achamos que este é um dos pontos mais importantes da Espiritualidade contemporânea: a tentativa de ir mais além das dualizações mentais, que implicam depois modelos sociais e humanos assimétricos. 
5.2. Uma Espiritualidade holística é uma Espiritualidade de sadhana pluralista. ‘Sadhana’ é um termo sânscrito que é o equivalente de ‘práctica espiritual’. É sinónimo de método ou disciplina espiritual também. Pode haver diferentes sadhanas dentro de uma EH. A EH não tem um método próprio.
Por exemplo, pode-se ser holista e practicar yoga, Tai Chi, meditação tibetana (várias formas), zazen, oração cristã (diversos modos), sufi, cabalista... Como diz um provérbio hindu, o importante é chegar ao cume da montanha, e não qual é o caminho que utilizamos. Neste sentido, uma EH será uma espiritualidade macro-ecumênica, ou seja, capaz de diálogo interno com todas as tradições espirituais.
Mas não implica necessariamente que seja religiosa. Pode-se ser holista e praticante de alguma das diferentes religiões históricas. Mas não necessariamente. Podemos ser ateus e agnósticos e ainda assim sermos pessoas “espirituais”. Isto seria um tema para desenvolver, mas, em princípio, achamos que isto deve ser possível. 
5.3. Uma EH será, necessariamente também, uma Espiritualidade de trascendência do ego. O ego é uma construção social, mas que é internalizada essencialmente pelos seres humanos. O perigoso é a nossa identificação com o ego. Nalgumas grandes tradições espirituais há quem fale do “pequeno ego” e do “grande Ego”.  
A virtude fundamental de uma EH é integrar o pequeno eu (o eu limitado e individal) no Ego universal (Deus, Todo, Cosmos, Absoluto..., segundo as diversas concepções).
Mas os egos também podem ser colectivos (Pátria, Partido, Religião, Género, clube, etc.). Valem só relativamente, não podem nem devem ser absolutizados. 
No momento em que somos vivencialmente conscientes de que o ego é o conjunto do nosso passado, uma acumulação de experiências, ideias, sentimentos, etc., então estaremos preparados/as para não mais “levá-lo ao pé da letra”. O ego é só uma metáfora que se auto-trascende. É preciso não se atar a uma metáfora. 
5.4. Importante também na EH é a corporalidade. Isto significa que o corpo também é Espiritualidade. Neste sentido, actividades como o Hatha-Yoga, o Yoga psico-físico, são essenciais no sadhana espiritual. 
O corpo não é um lastro a ser evitado ou obviado. Pelo contrário, a EH é a expansão da corporalidade ao máximo. Trascender até os sentidos considerados “normais”, para alcançar experiências parapsicológicas. Mas isto não é um fim em si mesmo. Porque pode-se converter numa projecção do ego, e então ser um perigoso desvio no caminho espiritual. 
O corpo não é só o nosso corpo físico. É também o corpo social e o corpo cósmico. De alguma forma, somos o Corpo Cósmico e poderiamos parafrasear o humanismo clásico dizendo que: “Somos o Cosmos e nada do Cosmos nos pode ser alheio”
5.5. A EH é, essencialmente, se assim se pode dizer, presencialista, ou seja, está concentrada em viver o Aqui-e-Agora, sem esforço nem tensão, simplesmente em Atenção Permanente. Há uma história oriental também neste sentido: 
“Após os seus dez anos de estágio, Tenno fez uma visita ao Mestre Tan-In.  
Era um dia chuvoso; foi de tamancos e guarda-chuva. Logo que entrou, o Mestre perguntou-lhe: Os tamancos ficaram lá fora...? Diz-me, então, se os deixaste à esquerda ou à direita do guarda-chuva. 
Tenno ficou confuso e sem resposta e concluiu que não fora capaz de praticar sempre, constantemente, uma Atenção Consciente. E decidiu passar com o Mestre mais dez anos...” 
O comentário a esta história é que “aquele que está sempre atento e consciente, totalmente presente a cada momento da vida, esse é o Mestre!” (5). 
Noutras palavras, a pessoa espiritual é aquela que vive o seu dia-a-dia com intensidade, como se fosse o último dia da sua vida. Está atenta ao que sucede à sua volta, mas também é consciente dos seus próprios pensamentos, sentimentos e emoções, dos seus próprios sentidos. Vive o Presente Eterno, ou a Eternidade do momento presente. Assim falaria alguém agnóstico ou ateu. Um cristão falaria de viver a Presença de Deus em cada momento e acontecimento. Mas, qualquer que seja a perspectiva, ambas vão dar no mesmo. 
A ideia é viver o céu na terra, o nirvana no samsara, o Macro no micro, “o lótus em fundo lamacento”. Não de escapar para um céu mais além, mas para viver o mais além no mais aquém. É este o repto da verdadeira Espiritualidade. 
Um provérbio zen dizia: antes de estudar o zen, a montanha era montanha e o vale era vale; depois que comecei a estudar zen, a montanha deixou de ser montanha e o vale deixou de ser vale; quando o satori (iluminação) chegou, a montanha voltou a ser montanha e o vale voltou a ser vale.  
Só quem teve esta vivência pode entender isto. “O que fala não sabe, o que sabe não fala”, dizia Lao-tse no Tao te King (Daodejing, LVI) (6). 
5.6. A EH resulta, por isso, tremendamente vivencial. 
Vivencial contrapõe-se aqui a teórico, intelectual. É algo próprio da Vida, algo que se impõe por si mesmo, pela “lógica das coisas”, ou melhor, pelo “ritmo das coisas”, como diria o taoísmo.
Sem prática quotidiana não há Espiritualidade, há Teoria da Espiritualidade. Também é boa a literatura espiritual, porque anima e tira dúvidas, mas vale mais dez minutos de prática de meditação para captar um pouco do que é realmente Espiritualidade...
‘Vivencial’ é algo do quotidiano. Contrapõe-se também a experiencial, algo situado no espaço-tempo, acumulação de experiências, acumulação de Passado. É preciso morrer ao Passado, para viver no Presente. Não é uma experiência mais, como a de alegria, ou tristeza, ou mágoa, ou esperança. É simplesmente estar, Ser. Não se programa. Acontece. Mas podemos prepararnos para que isso suceda. Prepararnos é limpar “os vidros sujos da janela, que não deixam entrar a Luz”, como escrevem as e os místicos de tradição cristã. Limpar os nossos apegos (a Abgeschiendenheit de que falava o Mestre Eckhart e o detachment dos budistas). 
5.7. Assim, a EH resulta totalmente contemplativa. Não no sentido relativo, de opor contemplação a acção, que seria outro dualismo perverso. É absolutamente contemplativa.
Mas o que significa isto? Isto significa que capta o ritmo das coisas, o Espírito que fala e age na história e na biografia. Que escuta o Silêncio, valha o paradoxo. Porque só no e desde o Silêncio é possível compreender a Vida mesma. Neste sentido é equivalente do não-agir (wu-wei) dos sábios taoístas. O não-agir é a suprema acção, aquela que age sem procurar agir. Ou melhor, é a acção espontânea, aquela que surge de dentro para fora, da nossa originariedade, da nossa autenticidade.
Neste sentido, toda e todo espiritual são contemplativos/as, ainda que estejam no meio do tráfego contínuo da vida (“o olho do furacão”). O Karma-Yoga indiano ajuda-nos também muito bem a viver esta perspectiva. O Karma-Yoga é o Yoga da acção, a união com o Absoluto, com o Divino, através da acção de cada dia.  
        Para isso é preciso ter em conta dois princípios: 
(1) O Espírito é o verdadeiro Agente
(2) Devemos estar des-apegados dos frutos das nossas acções.
O que é que significa em concreto isto? 
(1) Significa que é Ele/Ela quem actua preferentemente. Nós somos só os instrumentos (bons ou maus) da sua Acção. Por isso é bom des-apegarnos das nossas próprias ideias, métodos, objectivos (o nosso ego), para saber escutar as iniciativas do Espírito. Isto não quer dizer que não pensemos, deixemos de ter juízo crítico das coisas, ou que não formulemos objectivos. Mas o fundamental é subordiná-los à Acção do Único Agente, o Espírito. Deixemos que seja Ele/Ela quem escreva a História... com a nossa colaboração, claro.
(2)      Para isso devemos agir, mas des-apegados/as até dos frutos das nossas acções. Como intervem na História uma multiplicidade de causas, a objectividade das nossas acções escapam das nossas intencionalidades iniciais. Assim, pode acontecer que uma acção que realizamos com boa intencionalidade e que até é objectivamente boa, possa tornar-se inoperante ou até voltar-se contra nós, ou ser mal-interpretada e fonte de posteriores conflictos. Por conseguinte, a actitude mental correcta de quem pratica Karma-Yoga é não ficarmos atados, dependentes, escravos do êxito ou não das nossas acções. Façamos a acção por ela mesma, pelo seu valor intrínseco, e não pelo seu reconhecimento social. A alegria de quem pratica Karma-Yoga é fazer a acção que devia ter feito, no momento oportuno, alegrar-se com o valor intrínseco da própria acção, e des-apegar-se do reconhecimento exterior, ou até do seu resultado.
É preciso então muita liberdade interior e determinação para levar avante estes dois princípios do Karma-Yoga, o Yoga da Acção e do Dever. Tudo isto se inscreve perfeitamente dentro de uma Espiritualidade Holística. 
5.8. Finalmente, ainda que não exaustivamente, pois haveria outras características mais, a EH é uma Espiritualidade da  Solidariedade. 
Não basta a libertação interior. É preciso também a libertação exterior, económica, social, política e cultural. É este um ponto, em grande parte, novo, na agenda das místicas do último século e do presente. A/o santo de hoje deverão ser também “santas e santos políticos”. Ou seja, preocupados, misericordiosa ou compassiva-mente, pelo sofrimento alheio dos seres humanos e do resto da Natureza, na medida em que são provocados por determinadas relações sociais. 
Para isso, o místico/a do século XXI, deve ter também uma formação técnica em ciências humanas e sociais, ou, em seu defeito, uma sensibilidade aguçada para os sofrimento alheio e a procura de soluções alternativas. Os poderes dominantes usam o engano da “alternativa única”, de dizer que utilizam a única alternativa racional possível, que, por exemplo, estão a seguir os ditados “da” Economia ou “da” Política, sem dizerem que essa é uma determinada Economia e Política, e que pode haver outras, sem dúvida mais solidárias.  
Assim, uma Espiritualidade Holística é uma Espiritualidade que promove desde dentro para fora, com enorme solidariedade por tudo o que existe, novos modelos de organização económica, social, política e cultural que levem a uma justiça, paz e harmonia totais, e não só ao benefício de alguns privilegiados ou capas sociais dominantes. 
E, mais do que solidariedade, a EH falará de identificação. Identificação com as e os mais pobres e oprimidos. É colocar-se no posto, na pele deles e delas, e sentir como próprias as agressões em contra da Humanidade e do Resto da Natureza. 
Neste sentido, o Advaîta Vedānta indiano dá-nos  umas boas pistas de compreensão. A ideia central desta filosofia-espiritualidade é da unidade de tudo. O seu principal filósofo foi Shankara (aproximadamente, entre 788 e 820 d.C.), ainda que houve outros formuladores, como Rāmānuja (aproximadamente, s. XII d.C.), de fundo mais teísta. 
Para Shankara, só o Absoluto, Brahman, é realmente existente, pois é o Único que Permanece. Tudo o resto é ilusão, maya, no sentido, em que não é permanente. Brahman (ou Atman, o Espírito) é unidade pura. A multiplicidade das almas e do mundo são aparência. Só o sábio compreende que esta aparente multiplicidade (que é própria do conhecimento relativo) não é, no fundo, senão uma expressão do Único Realmente Existente, que é Brahman. Assim, este conhecimento vivencial, mais do que intelectual, é o verdadeiro conhecimento, o conhecimento absoluto, aquele que verdadeiramente liberta. 
Pois bem, sem nos atarmos totalmente ao modelo ontológico do Advaîta Vedānta, mas inspirando-nos nele, poderemos, com a sua ajuda, interpretar de maneira profunda, a conhecida passagem evangélica da parábola do Bom Samaritano (Lc 10, 29-37).  
Com efeito, a questão não é só que o Samaritano enternece-se, ou é movido a compaixão, pela situação do judeu assaltado e caído meio-morto ao lado do seu caminho. Não é só que o ajuda paternalísticamente, quando o normal seria, dado o ódio/desprezo étnico mútuos, e dada a incerteza da situação (podia ser uma armadilha para ser assaltado ele próprio por bandidos, tão frequente isto naqueles dias em Israel), que se fosse embora, escapando quanto antes desta situação incómoda e perigosa. Esta imagem ainda é própria de uma visão superficial e dualista (“eu me compadeço de outro, coitado!”). 
Mas, desde o ponto de vista de uma EH, eu sou o outro caído. Identifico-me com ele, porque ambos somos o mesmo. Sinto o que lhe aconteceu a ele, como se mo tivessem feito a mim próprio. Eu sou ele. Ele é eu. Somos uma unidade. Por isso, ajudo-me a mim próprio, ajudando o outro. E vice-versa. O sofrimento dele é o meu. E não posso soportá-lo! Levantando-o e tratando dele, eu me ajudo a mim próprio. 
(Entre parêntesis, aqui estaria uma boa fundamentação também para qualquer trabalho profundo de solidariedade ecológica: “Eu sou a Natureza: o que lhe fazem a ela, fazem-me a mim próprio!”). 
Esta ideia da unidade de tudo, e, portanto, da identificação com o Cosmos e os seus sofrimentos, especialmente dos mais pobres e oprimidos, é, sem dúvida, a aposta mais radical da Espiritualidade Holística a nível social.
Ficamos por aqui.  
Somos conscientes de que tudo o anterior poderia ter sido mais desenvolvido e melhor explicado, mas esperamos voltar noutra ocasião sobre estas e semelhantes questões. De momento, aqui fica, na nossa opinião, o essencial do programa de uma Espiritualidade Holística para o século XXI.  
Calha-nos a nós fazê-la verdade, ou seja, vivê-la! 
rui manuel
lisboa, 27.05.10.
(1) ANTHONY DE MELLO, O Canto do pássaro. Paulinas, Lisboa, 1998, p.39.
(2) A Realidade que captamos com a nossa mente-sentidos é dualista. De facto, a dualidade é uma construção mental, meramente operativa para trabalhar no meio da realidade empírica. Em último termo, a Realidade é una. Mas a multiplicidade é a maneira de manifestar-se a nós. Ou seja, é uma unidade dual ou unidade múltiple. Os Taoístas afirmavam que a realidade se nos apresenta como Yin e Yang, mas ambas, Yin e Yang, não são senão os dois braços do Um, o Tao, ou melhor, do Vácuo, que, como tal, transcende o Um. O Tao está para além do mesmo Um (o Vácuo original é o “útero” do Um e da posterior dualidade e multiplicidade, numa metáfora de acento heideggeriano). O Não Ser é a origem do Ser. 
(3) Fazemos uma diferencia entre ‘experiência’ (que é espaço-temporal) e ‘vivência’ (mais além do espaço-tempo).
(4) É só numa ‘vivência transcendental’ que é possível “captar” a Totalidade. Só é possível no Silêncio total. Ou seja, no momento em que o ego, ou acumulação do passado, cessa, e ‘o novo’ surge (Jiddu Krishnamurti deu-nos boas “dicas” para “entender” isto). O Todo, “Aquilo”, surge quando acaba o Passado, ou seja, quando cessa a estrutura das nossas experiências passadas, dos nossos pensamentos, sentimentos e afectos acumulados, quer dizer, quando “acaba” o nosso ego, que não é senão uma construção social. 
(5) ANTHONY DE MELLO, O canto do pássaro. Paulinas, Lisboa², 1998.
(6) Cfr. LAO TZU, Tao Te King, o Caminho da Virtude. Livros de Vida, Mem Martins², 2007, p. 121; LAO TSE, Tao Te King. Estampa, Lisboa, 6ª.ed. 2000, p. 69. Recomendamos, sobre filosofia taoísta, o livro de VV.AA., A filosofia “materialista” chinesa. José Galamba, Torres Novas, 1978.


Acessado em: http://www.triplov.com/novaserie.revista/numero_04/rui_gracio/index.html