segunda-feira, 27 de fevereiro de 2012

Vejo pessoas mortas matando pessoas mortas...




Comentários sobre The Walking Dead (AMC – Série)



            Eu gosto das series americanas, porque as vezes elas fazem bem mais sentido que alguns filmes. Além disso, o tamanho de cada episódio é bem mais prático que um filme de três horas inteiras. Logicamente que existem alguns problemas técnicos, como por exemplo, a questão de serem enlatados básicos e típicos, que de um modo ou de outros são veículos colonialistas ideológicos, que apregoam valores estadunidenses, bem fora da lógica local.
           Tenho assistido, mais por falta de opções do que por gosto real, uma série chamada The Walking Deads, da AMC [i], que tem tido bons índices de audiência, coisa que de qualquer forma é relevante, não apenas por ser um sucesso, mas principalmente porque talvez esteja falando algo que faça muito sentido para esses dias.
            The Walkind Dead é uma serie que deveria ser classificada como drama, pois as relações entre as personagens são realmente conflituosas, alias, em boa parte desta série, grande parte dos problemas reais são causados por pessoas vivas e não pelos monstros. Temas relacionados como famílias, paternidade, problemas de relacionamento conjugal, adultério, velhice e o problema das crianças. Outras formas de ver, poderíamos classificar dentro do gênero de terror, pois os mortos vivos são típicos. A serie não pode ser juntada no grupo da ficção cientifica, pois não traz em sua base elementos científicos que expliquem cientificamente o problema dos mortos vivos. De fato, tal explicação não é de fato necessária por fazer parte do processo narrativo, pois a questão da obra não é explicar coisas que não existem, mas falar de coisas reais relativos à vida e expresso por meio de personagens parecidas conosco.
            O gênero sério é de qualquer modo um tipo de novela, que teoricamente tem começo, meio e fim. É claro que as séries, como produto capitalista, ela pode ter vários começos, meios e fins, pois cada temporada pode construir uma situação, uma crise, que vai sendo resolvida ao longo do ano, e no final parte do problema é resolvida em parte e outras pontas são abertas. Lost, por exemplo, tinha um grande problema, já programado para ter sete temporadas, e portanto, cada temporada tinha uma ênfase dentro de um problema básico que era o sair da ilha. No caso do The Walking Dead, que é baseado no original homônimo dos quadrinhos, a narrativa segue uma lógica geográfica, onde a cada temporada uma questão que afeta diretamente a sobrevivência incide sobre as personagens, grande parte delas perecerá para que na próxima temporada novas personagens apareçam. Isso é bem interessante porque possibilita que novas questões e problemas possam se desenvolver na série.
            Cosmologicamente a série se passa no interior dos Estados Unidos, na região sul, no estado de Georgia, região de fazendas, com clima quente. Até agora, não houve informações com respeito ao local onde a doença, que transforma pessoas em mortos vivos, surgiu. De fato, a única coisa que se sabe é que os mortos tornam-se zumbis, sem alma, com fome, ouvem, vêem e sente odor de coisas vivas. Aparentemente a dieta é composta por carne, humana de preferência, ou talvez, de cavalo de preferência, pois no segundo episódio, eles ignoraram Rick, para comer seu cavalo. Basicamente um zumbi é fácil de lidar, tanto que é possível controlá-lo com um laço de pegar cachorro e se for o caso, um tiro, pedrada, flechada ou facada na cabeça pode desativar a tal criatura. Mas fiquei pensando no seguinte: quanto tempo eles vivem sem comer? Eles morreriam de inanição? Outros animais poderiam tornar-se zumbis? Imaginem um bicho destes em um confinamento bovino? Outra coisa, no final, eles vão exterminar toda a vida anima da terra, pois se eles comem de tudo, imagine os tubarões zumbis.
            Uma mensagem interessante disso, é que a multidão de mortos vivos é impossível de ser controlada. Neste sentido, temos a luta entre o individuo e a multidão de idiotas que não tem discernimento além de sua fome. Matar um zumbi destruindo seu cérebro é simbólico também, pois é atingir o tal inimigo em sua função central enquanto ser. Se considerarmos também que a face humana é simbolicamente a representação do ser, o ato de atirar ou bater para desfigurar, é simbolicamente uma forma de retirar a humanidade que está ali, em parte para que a criatura passe de morto vivo para morto pleno.
            As personagens desta série são bem interessantes porque representam grandes valores da sociedade americana. Primeiramente o principal é um policial, muito honesto e eficiente, a tal ponto que depois do apocalipse zumbi, ele se preocupa em vestir seu uniforme de policial e de vergar um Magnum 44. Acho que a cena dele cavalgando em direção a uma cidade, é bem conhecida e simbólica no sentido do herói que entra armado procurando problemas. Depois aparece o oposto igual, que é chamado de Shane, que é também um policial, que torna-se líder de um grupo de sobreviventes. Eles são a chave da relação primeira entre id e super-ego, pois Shane parece não ter muito super-ego, enquanto que Rick é a culpa em pessoa, sempre fazendo a coisa certa que parece ser a coisa errada.
            Ainda no núcleo masculino, temos os opostos bem colocados, e em contradição, os velhos que tem alguma experiência e parecem estar certos, mas que ninguém leva há sério. Os jovens, representados por Glenn, que só tem suas pernas para correr, também não têm muito poder de decisão nas coisas realmente sérias. Hershel, que aparece na segunda temporada, é a figura paternal fracassada, que uma vez conectada a Rick, acaba adotando-o como filho. Dale, o tiozão simpático, fica cultivando uma relação de cuidado com Andréia, que de fato não tá afim do velho de forma alguma. Alias, sexualmente as mulheres desta séria estão sempre em defict.
            Falando das mulheres da série, temos a tal Lori, que é mais perigoso que parece, e não tendo coragem de interromper sua gravidez, vai por a cabeça do Shane a premio. Andréia é uma personagem estranha de qualquer maneira, e no fim, se a série seguir a lógica do quadrinho, ela vai acabar nos braços de Rick. Ela, de fato, está procurando o macho alfa da matilha, haja vista a relação dela com Shane, que tenta cantar de galo grande parte do tempo.
            Quanto as crianças, elas são comida de zumbis a priore, portanto não merecem ser citadas. Logicamente que Carl é importante, mas vai morrer de um jeito ou de outro, pois começa paulatinamente a manifestar um espírito de fodão, e não enxergar que é um moleque. Nisso Glenn tem seu mérito, por saber realmente qual é seu lugar no mundo, e por isso tem boas chances de sobreviver.
            Voltando a discussões de gênero literário, esta serie tem alguma coisa muito comum nas séries recentes de sucesso, a saber, o autor mata personagens querido do publico. Isso pode ser visto no Lost, no pilares de terra, e principalmente no A Guerra dos Tronos. Acho que se isso fosse na década de 70, as coisas seriam diferente, e somente os errados morriam cedo. Se bem que acho que deveria comprar as séries antigas para dar uma olhada, alguns temas eram até profundos. Talvez isso seja uma expressão interessante de nossa era e de nosso padrão de consumo literário.
            De fato, assisto The Walking Dead e vejo pessoas mortas matando pessoas que já estão mortas, de uma forma ou de outra. Fico imaginando o que eu faria se estivesse nas mesmas condições que as personagens, seria bem complicado de qualquer maneira. Fico preocupado pensando que se eles obedecessem o assassino do Shane, grande parte dos problemas seria vencidos com mais facilidade, e mais pessoas estariam vivas no grupo. Isso me preocupa, porque talvez isso seja uma mensagem interessante de que o autoritarismo e a prepotência seja uma via política que funciona, e sabemos das conseqüências disso.
            Outra preocupação que me acontece, são aqueles atentados que acontecem sempre nas escolas americanas, e no Brasil começa a acontecer de jovem que vão a escola matar seus inimigos (professores e alunos). Matar zumbis parece estar na mesma categoria que isso, de modo que jovens idiotas, surtando, podem vir achar que todos são zumbis ou extraterrestres e por isso precisaria ser mortos à bala.
            Por fim, não acho que censurar esse tipo de obra seria uma boa idéia, pois os demônios já estão nas pessoas, mas acho que deveríamos fazer um exame no que torna essa obra ficcional tão atraente e tão cheia de sentido e significa, pois ela não expressão apenas idéias de um autor, mas expressão uma série de discursos que já estão na mente e na vida de sua audiência.

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