Nesta ultima semana, mataram mais um índio. Eu me pergunto, e daí? As pessoas morrem, não é verdade? Todos os dias têm gente morrendo, brancos, negros, homens, mulheres e crianças, todo tipo de pessoas estão morrendo diariamente. Hoje, pela manha, vi um cortejo, alguém morre e nem imagino quem seja...
Mais um índio morreu. Todos os dias morrem indígenas, acho. São mais ou menos uns 70000 no Mato Grosso do Sul. Considerando esse numero, dividido em pelo menos 6 etnias diferentes, sendo algumas nem reconhecidas, alguém deve morrer pelo menos uma vez por semana, ou mais.
Mais um índio morreu. Poderia ter morrido de velho, pois a idade não perdoa ninguém. Poderia ter morrido de acidente de carro, pois o transito está a cada dia mais complicado, mas seria improvável, considerando o fato de poucos indígenas aldeados terem carro.. Poderia ter morrido de acidente de motocicleta, pois os indígenas geralmente não têm muito dinheiro, e tendo que trabalhar utilizam-se de motos, ou mesmo bicicletas para chegar ao serviço. Alias, poderia ter morrido em um acidente laboral, talvez um desabamento ou um poço mal cavado, tem chovido muito ultimamente, ele poderia ter sido levado pela chuva.
Mais um índio morreu. Eles poder ter morrido na fila da Santa Casa de Campo Grande, por causa de uma doença simples. Ele poderia ter morrido de Leishmaniose, pois no estado já são milhares de casos, ou mesmo de dengue. Poderia ter morrido em uma briga de torcidas, mas graças a Deus, no MS não tem time de futebol.
Mais um índio morreu. Ele poderia ter morrido de fome se fosse um bebê, mas era um adulto. Ele poderia ter sofrido infanticídio, mas sua mãe teve sorte de conseguir criá-lo para ter orgulho dele, pois ele era um cacique, coisa parecida com um prefeito dos brancos (se é que alguém é branco no Brasil). Ele deveria ter filhos e netos, que deveriam ser orgulhosos dele. Ele poderia ter se suicidado como alguns de seus patrícios, que em meio à tristeza das condições que lhes são postas acham melhor ir aos antepassados por vontade própria do que esperar que alguém os envie pela via da bala.
Mais um índio morreu. Não morreu por acaso. Uns 40 homens armados entraram em seu acampamento, o chamaram para fora, fuzilaram na frente de sua casa, e depois sumiram com o corpo. Parece até aqueles grandes combates de traficante do Rio de Janeiro, mas era apenas um velho que tentava conquistar uma terra para viver com um pouco de dignidade. Seu crime foi blasfemar contra a lógica do capital, seu erro foi acreditar que não seria punido, sua ilusão foi pensar que existe justiça ao sul do Mato Grosso do Sul.
Mais um índio morreu. Mas será que ele morreu? Fico me perguntando se ele morreu mesmo, pois se todos dizem que morreu, mas as emissoras de TV disse que ele apenas desapareceu, talvez ele nem tenha existindo, assim como o restante dos indígenas que passam necessidade no sul do estado. Não os vejo, não sinto o seu cheiro, vejo apenas fotos na internet, talvez eles não existam de fato, talvez sejam intenção de alguma ONG. Talvez as milhares de famílias morando em casebres e aldeias sem assistência seja apenas um plano para destruir a economia do Mato Grosso do Sul, enchendo as terras de índios. Mas se eles não existem, como eles encheriam as terras?
Mais um índio morreu. Ele não era santo. Aliás, ninguém é santo. Ser santo ofende o próprio conceito de Deus e divindade, porque somos todos humanos. Não conheço seus erros, mas nenhum pecado merece quarenta homens armados na porta da sua casa. Ele não era santo, mas alguém que morre na luta de um mundo melhor para os seus deveria ser considerado como um ao lado de Marçal de Souza, Zumbi dos Palmares, Chico Mendes, e outros...
Mais um índio morreu. E infelizmente não será o ultimo. Junto de outros que ainda serão fuzilados, morreram crianças, jovens, mulheres. Também morreram homens e mulheres não indígenas, porque o sistema que matou aquele índio é o mesmo sistema que gera a pobreza de milhares e a riqueza de alguns. Aliás, os fazendeiros são pobres, pois não tem paz, morrem de medo de antropólogos. Quem fica rico mesmo são bancos e grandes corporações que se beneficiam do trabalho de todos, fazendeiros e índios. Esse mesmo sistema econômico gera o tráfico da maconha do Paraguai, que passa pelo MS sem ser vista, para depois ser queimada no hemisfério norte.
Mais um índio morreu. Poucos ficaram sabendo, menos são os que se importam. E daí? Vida e morte, todos morreremos. Mas ao achar isso normal, matamos a nós mesmos, pois, nossa própria morte passará despercebida. Pelo menos, a morte deste ser humano está cheia de significado e sentido, porque é melhor morrer lutando por algo digno, do que viver sem dignidade.
Mais um índio morreu, e daí?
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